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Sobre o Laboratório de Esquizoanálise

Não é sempre que podemos criar uma oportunidade para chamar a atenção criticamente sobre o que e como estamos vivendo nossas vidas no nosso presente e no contexto de nossa época.

Temos um especial prazer nesses encontros que nos propomos realizar, pois experimentamos um gosto raro ao dirigir uma luz plena de potência vinda das profundezas intensivas, que recoloca o foco crítico dos nossos problemas de relacionamentos sob a ótica da cumplicidade e não da culpa.

Isso nos faz perceber que a suposta responsabilidade pregada pelas práticas moralistas não passa de um modo sofisticado de trapacear e sabotar as modalidades de vida intensa, ativa e criadora de valores.

O crente em ideais superiores necessariamente rebaixa, por impotência, o plano comum dos encontros onde a vida e toda a existência se realiza como numa das faces do absoluto.

Mas esse plano e todo acontecer da vida só pode ser rebaixado por ficção, ficção das vidas tornadas impotentes que se tornam, num segundo tempo, por mau uso do que lhes acontece, irresponsáveis com as condições de uma vida criadora, renegando todo acontecimento como acidental, casual, efêmero, isto é, um nada!

Um nada de acontecimento que já nadifica os devires do presente e preenche de signos mortos o horizonte do porvir de uma vida separada de suas potências de acontecer.

Por isso mesmo não nos cansamos de fazer esse apelo crítico: toma para ti a responsabilidade intransferível, aquela de tomar a tua vida nas próprias mãos e fazer dela uma experiência extraordinária, dessas que pode te tornar um grande vivente!

Eis nosso propósito, o de preparar e nos preparar para nos pormos em processo! O de tornar disponível o tempo e nos dispor a experimentar modos de viver cuja prontidão nos torna capazes de verdadeiros encontros com nossa potência primeira e plena de acontecer, a qual nos constitui de direito como comandantes inalienáveis de uma existência criadora do próprio destino!

Fazer desse potencial vivo que nos constitui, que está e segue em nós, e que não se pode perder, um comandante coexistindo e iluminando os acontecimentos de nossa vida!

Se ao desejo nada falta, como poderia ainda essa potência viva seguir em nós separada de nosso modo de existir, sem que dela pudéssemos nos apropriar? Eis nosso devir reativo e suas linhas de morbidez, enquanto permanecermos devotos às ficções moralistas de correção da vida!

É com esse nosso desejo a um só tempo combatente e criador que nos fazemos aliados das vidas que valem a pena, daquelas dos grandes viventes que nem culpabilizam nem se culpabilizam pelos maus encontros.

Mas de tudo que acontece de bem e de mal nessa vida sabem ser dignos e se implicar com elevação, sem baixezas. Sabem extrair seu esplendor neutro, necessário, inocente, o estofo de toda eternidade!

Há toda uma força vital que já está em nós mas que, como maus jogadores, desperdiçamos.

Deixamos de acessar a plenitude de uma realidade virtual do desejo por puro mau jeito com a vida que levamos, pelo modo passivo de existirmos. E que nos reduz e nos confunde com o acontecido de cada acontecimento. E que nos faz desejar sempre a partir do mal passado como já consumado!

Quais cumplicidades estariam implicadas nos nossos modos de desejar, sentir, pensar e agir, que não podemos delegar a uma causa exterior e nem mesmo atribuir à falta de um outro?

Somos de modo recorrente não culpados, mas cúmplices dos maus jeitos que machucam e atolam nossa vida e a dos outros.

Precisamos urgentemente aprender a reconhecer nossas quedas para aprender a levantar com pernas próprias, não pendurados ou colados no poder que a um só tempo nos humilha para nos empoderar como seus pré-postos convertidos.

Nos levantar com potência autônoma, que bebe direto da fonte sem centro de poder, descolados de todo poder e da impotência que este pressupõe. Eis nosso propósito ético!

Nos elevar pela nossa própria potência de criar distância e nos descolar do que nos tornamos como seres rebaixados.

Nos elevar de fato ao que nos pertence de direito, à nossa potência de acontecer.

Sem deixar nosso corpo de potência reduzir-se a qualquer fato vivido ou intoxicar-se com um acontecimento indigerível.

Sem as lamúrias de um desejo vitimizado, nem as arrogâncias de um poder que se alimenta da impotência e das paixões tristes!

Numa experiência clínica em grupo criamos e tomamos a distância necessária não só em relação aos meios de sociabilidade nos quais estamos inseridos, mas sobretudo em relação aos modos e condições de sociabilidade que aderimos ou adotamos para nossas vidas.

Distância que nos dá a condição de compreender nossas capturas por maus usos dos nossos afetos e vontades de reconhecimento e recompensa.